FUNRURAL – Atual cenário após o novo julgamento do STF e promulgação da Resolução do Senado Federal

Após nova manifestação do Supremo Tribunal Federal (“STF”), volta à tona a discussão acerca da constitucionalidade da cobrança do Funrural e dos efeitos práticos do novo entendimento da jurisprudência sobre as operações praticadas por produtores rurais.

Histórico. A contribuição ao Funrural foi originalmente instituída pela Lei n.º 8.540/92, que previu a incidência sobre a receita bruta auferida por produtores rurais pessoas físicas com a comercialização de sua produção rural. Por regra de substituição, os adquirentes da produção eram responsáveis pelo retenção dos valores dos produtores e recolhimento aos cofres públicos.

Com base em fundamentos como a necessidade de lei complementar, bitributação e quebra do princípio da isonomia, o STF declarou a inconstitucionalidade do Funrural, realizada com base na Lei n.º 8.540/92 e suas atualizações até a Lei n.º 9.528/97. Este julgamento foi realizado em 2011 e contou com o voto da maioria dos Ministros, resultando na declaração da inconstitucionalidade dos artigos 12, incisos V e VII (fato gerador), 25, incisos I e II (base de cálculo e alíquota), e 30, inciso IV, da Lei nº 8.212/91 (sub-rogação), com as redações dadas pelas Leis nº 8.540/92 e nº 9.528/97.

Este julgamento desencadeou no ajuizamento de ações judiciais por milhares de contribuintes, que buscaram o reconhecimento do direito ao não recolhimento do tributo e reaverem os valores que foram recolhidos nos últimos anos. Muitos até obtiveram decisões liminares e sentenças favoráveis, inclusive definitivas, que afastam o dever de pagamento.

Novo julgamento. Apesar da aparente definição do assunto, a discussão voltou à apreciação do STF, que em julgamento realizado em março de 2017, alterou o entendimento anterior e declarou ser constitucional a cobrança do Funrural.

Neste julgamento, o STF analisou a validade da cobrança sob o prisma da atual legislação, consubstanciada na Lei n.º 10.526/01. Novamente por maioria de votos, os Ministros concluíram que a legislação atual, por ter sido editada após a alteração da Constituição Federal pela Emenda n.º 20/1998, teria validado a incidência do tributo. Em termos práticos, o STF concluiu ser válida a cobrança do Funrural feita após a edição da Lei n.º 10.526/01.

A par das severas críticas a este julgamento, tecnicamente deficiente e dotado de cunho evidentemente político, é certo que a declaração de constitucionalidade do Funrural reabre a possibilidade de cobrança do tributo, gerando enorme insegurança jurídica e dúvidas práticas sobre o alcance do novo entendimento.

Embora o acórdão do STF ainda não tenha sido publicado e possa ser objeto de modulação, o Governo Federal dá indícios de que promoverá a cobrança retroativa da contribuição, tanto que editou a Medida Provisória n.º 793/2017, instituindo o Programa de Regularização Tributária Rural (“PRR”), objetivando de estimular o pagamento de débitos passados por contribuintes que vinham deixando de recolher o tributo.

Para as operações futuras, a citada Medida Provisória reduziu a alíquota então vigente para 1,2%, a ser aplicada a partir de 1º de janeiro de 2018. 

Resolução do Senado. Com vistas a proteger os produtores rurais contra a reversão do entendimento do STF, o Senado Federal promulgou a Resolução n.º 15/2017, por maio da qual suspendeu a execução dos artigos que haviam sido declarados inconstitucionais pelo STF (arts. 12, incisos V e VII, 25, incisos I e II e 30, inciso IV, da Lei nº 8.212/91, todos com a redação atualizada até a Lei n.º 9.528/97).

Na prática, a suspensão destes dispositivos retira os fundamentos legais para a cobrança retroativa do Funrural, na medida em que tais artigos é que preveem os elementos básicos para a cobrança, como a base de cálculo e alíquota, sem os quais não pode ser realizado o cálculo e cobrança do tributo. Ademais, a Resolução retira a validade da regra que impõe ao adquirente o dever de reter e recolher, por substituição, o valor do tributo devido pelos produtores.

Remanesce, no entanto, a discussão acerca do início da vigência da Resolução do Senado. Há divergência na doutrina e jurisprudência se a norma produz efeitos retroativos (“ex tunc”) ou apenas efeitos a partir da sua promulgação (“ex nunc”), o que poderá gerar debates a respeito da possibilidade da cobrança de tributos lançados antes da promulgação da Resolução. 

Conclusões. Tecnicamente, entendemos que a suspensão da execução dos dispositivos tratados na Resolução do Senado Federal produz o efeito de coibir a cobrança dos débitos pretéritos, pois retiram a base legal para a constituição do crédito tributário, ou seja, para o lançamento e cobrança do tributo. Ademais, retira a obrigação legal que os adquirentes tinham de efetuar a retenção e recolhimento do tributo.

De toda forma, diante da complexidade do assunto e do cenário de incertezas que ainda o cerca, em especial pela possibilidade de questionamentos a respeito do termo inicial de eficácia da Resolução do Senado, recomendamos que a situação dos contribuintes e responsáveis sejam analisadas de maneira individual e muito cautelosa, tomando-se os cuidados necessários para a proteção contra autuações fiscais e imposição de multas pelo Fisco, inclusive através do ajuizamento de medidas judiciais.

Ricardo Lemos Prado de Carvalho
Sócio do Prado De Carvalho, Ormeleze & Giorgio Advogados

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